O contexto atual é, realmente, muito complexo e instável. Há enormes variáveis políticas, judiciais e econômicas, que podem alterar totalmente o cenário, tanto no Executivo, quanto no Legislativo. É costume dizer que o cenário político muda rapidamente, como as nuvens no céu. No momento atual, contudo, o que vemos no céu é uma tempestade. Essa instabilidade já é, por si só, um desafio para a gestão. Mas, mesmo que estivesse tudo estável, os desafios para os defensores públicos, a Defensoria Pública e as pessoas em condições de vulnerabilidade são imensos nestes dois próximos anos. A agenda econômica e administrativa que foi apresentada pelo atual Governo traz uma concepção de Estado-mínimo, de enxugamento dos serviços públicos e dos direitos e benefícios sociais. Isso atinge os defensores públicos por dois ângulos: enquanto servidores públicos – que vêm constantemente sendo criticados e que sofrem riscos de perdas de direitos, como os previdenciários – e enquanto responsáveis pela prestação de assistência jurídica, integral e gratuita às pessoas em condições de vulnerabilidade, que sofrerão as consequências da piora e da diminuição de políticas públicas relevantes, como nas áreas da educação, saúde e moradia. Como dizia o mote da nossa chapa, agora diretoria eleita, é hora de “resistir para avançar”.
Primeiramente, realizando com excelência o nosso trabalho! Cada defensor público, em cada órgão de atuação, seja qual fora a área – família, cível, criminal, tutela coletiva etc. – representa a instituição e o seu bom desempenho repercute na imagem política que a Defensoria Pública tem como um todo junto à sociedade e aos poderes públicos locais e estaduais. Para além disso, a atuação articulada e especializada da Defensoria Pública, principalmente através das suas atribuições institucionais de educação em direitos, de orientação preventiva, de solução extrajudicial de conflitos, entre outras, pode contribuir para a resolução mais rápida e efetiva de muitos problemas que o agravamento da crise econômica vem provocando em um número cada vez maior de pessoas. Essa resolução mais rápida e efetiva certamente é de interesse dos governos e precisa ser divulgada e destacada.
A primeira maneira de auxiliar é realmente através de uma força-tarefa. Mas todas as defensoras e defensores públicos sabem que forças-tarefas e mutirões só têm validade em determinados momentos específicos de caos, mas não são soluções para os problemas crônicos da morosidade judiciária, do superencarceramento e das suas condições cruéis e degradantes. A primeira ajuda que a Defensoria Pública pode dar é justamente esclarecendo isso para a sociedade, para a mídia e para os demais órgãos públicos envolvidos no tema, para não servir de instrumento legitimador de uma ação midiática e limitada. Para além disso, a Defensoria Pública deve procurar apresentar propostas administrativas e legislativas que toquem nas causas estruturais dessa dantesca situação, como, por exemplo, o desrespeito judicial a dispositivos claros do Código Penal e da Lei de Execuções Penais e até a súmulas do STF e do STJ, como as que dizem respeito à fixação e progressão de regime prisional. Esse é apenas um aspecto, mas há vários outros.
Certamente a Reforma da Previdência vai nos exigir total atenção e atuação legislativa. Há também as propostas que visam regulamentar o teto remuneratório do serviço público e que impede o recebimento de verbas pela cumulação ou substituição e pela atuação em plantões. Por fim, há os projetos de redução de direitos, como a redução da maioridade penal, que a ANADEP vem acompanhando há anos e que podem ter andamento a qualquer momento.
Sim, a comissão especial foi reativada e diversas articulações vêm sendo feitas com as entidades representativas das demais carreiras do sistema de Justiça – AMB, Conamp, Anape, Anadef – e as carreiras do serviço público. O foco principal será a manutenção das atuais condições de aposentação válidas para os defensores públicos em atividade. Subsidiariamente, no mínimo que haja regras de transição mais razoáveis e válidas para todos os já sujeitos às regras vigentes.
Após as grandes conquistas legislativas com a LC 132 e a EC 80, passou-se à fase de regulamentação e implementação dos direitos e garantias, da instituição e da carreira, como a autonomia orçamentária e a iniciativa de lei. Em alguns estados isso tem sido mais difícil e é de suma importância que a Associação Nacional esteja presente e apoie, tanto politicamente como judicialmente, a luta das associações locais. Os direitos e garantias assegurados em nível constitucional devem ser respeitados em todas as unidades da federação.
Apesar do cenário político e econômico, considero possível. A ANADEP veio desenvolvendo nos últimos anos um trabalho de sensibilização e pressão junto ao Governo do Estado, que, recentemente, surtiu efeito, tendo, inclusive, a Secretaria de Governo procurado a Associação para discutir os termos de um edital para o 1º concurso para defensor público do Estado. A situação lá é totalmente irregular e, parece, que o governo reconheceu que necessita alterá-la.
Creio ser possível afirmar que, hoje, infelizmente, a Defensoria Pública é a única instituição do sistema de Justiça que atua fortemente na promoção e defesa dos Direitos Humanos e na reparação de suas violações. A promoção e defesa, para além da atuação judicial, deve ser feita também no âmbito da educação em direitos – o que inclui campanhas publicitárias de esclarecimento – e no âmbito legislativo, para que projetos de lei restritivos não sejam aprovados, como o já citado sobre a redução da maioridade penal.
Além do aspecto acima mencionado, da atuação efetiva na promoção e defesa dos Direitos Humanos e na reparação de suas violações, creio que o outro aspecto que mais diferencia a Defensoria Pública é o seu foco preferencial na solução extrajudicial de conflitos, valendo-se de novas formas de atuação – educação em direitos, conscientização, orientação preventiva, conciliação, mediação, atuação multidisciplinar –, que buscam maior efetividade e celeridade da intervenção estatal – no caso, por meio da Defensoria Pública –, evitando-se o prolongamento indeterminado, e eventual agravamento, dos conflitos.