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Defensora Amélia Rocha escreve sobre “Multa” no jornal O Povo

Amélia1. Planejando uma viagem, comprei, com antecedência de mais de 6 (seis) meses, um pacote de passagem aérea e hospedagem. Com mais de 3 (três) meses antes da viagem, resolvemos desistir. Sabia que era justo pagar uma multa pela desistência; mas surpreendi-me quando fui cobrado em uma multa equivalente a 60%.
Isso é certo?

RESPOSTA: Aparentemente, o percentual é abusivo, principalmente porque você avisou com tempo considerável de antecedência, o que certamente permitiria a renegociação do pacote pelo fornecedor. Mas é preciso sempre examinar peculiaridades do caso concreto – o que não cabe aqui – pois não existe “fórmula pronta” sobre abusividade e a mais importante delas é se foi avisado antes. O CDC – Código Brasileiro de Proteção e Defesa do Consumidor, no artigo 46, é bastante enfático ao dizer que “os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.”

2. Mas então basta avisar para que o fornecedor possa impor uma multa em qualquer percentual?

RESPOSTA: Não, não, o simples fato de avisar não torna uma multa abusiva, legitima. Tanto que o CDC prevê que a vantagem manifestamente exagerada, mesmo que avisado, permite a revisão do contrato. Mas há casos em que o valor era promocional e a “contraprestação” era a não desistência, assim, uma vez que pactuado previamente, de forma clara e ostensiva, tais termos seriam válidos.

3. Seria o caso, portanto, de uma passagem aérea que custa cerca de R$ 1 mil e em uma promoção é vendida por R$ 150,00, mas se não voar no dia, a taxa de remarcação e no show compromete parte considerável do valor pago pela passagem?

RESPOSTA: Exatamente, neste caso ter-se-ia vantagens para ambos: o fornecedor quer garantir a venda de todos os assentos da aeronave e o consumidor quer comprar com o desconto de 85%, então o consumidor, desde que avisado previamente, assume o risco de praticamente perder a passagem se não voar no dia, pois antes da compra fora informado todas essas condições, inclusive que se comprando com menos desconto haveria a possibilidade de remarcação. Foi vantajoso para ambos, e, portanto, não haveria abusividade.

4. Mas e nos casos em que não é promoção, mas o próprio valor de mercado e sem nenhum aviso prévio sobre casos de desistência?

RESPOSTA: É diferente o que, em tese, autorizaria o questionamento de multa exorbitante, com base, especialmente, nos artigos 6, V, 46 e 51 do CDC, pois o CDC é muito claro ao estabelecer que o equilíbrio é princípio do direito do consumidor (CDC, art. 4º, III) e, em consequência, deve ser buscado em todos os contratos de consumo.