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Defensora Amélia Rocha escreve sobre “Tempo útil e consumidor”

Amélia1. Certa vez tive um problema com um fornecedor e para resolvê-lo, em uma semana precisei ausentar-me três vezes do trabalho. Depois disso, ainda precisei ausentar-me mais duas vezes e ainda não foi resolvido. Tem como ser indenizada por tal “perda de tempo”?

RESPOSTA: A grande questão da responsabilidade civil é o chamado “nexo de causalidade”. Ou seja, se a perda de tempo gera prejuízo a responsabilidade é de quem a deu causa. Por muito tempo esse “tempo gasto” foi tido como mero aborrecimento e não era indenizável, mas apenas contemplado pelo “ônus da sucumbência”, que é o ressarcimento, pelo vencido, das despesas do vencedor da demanda (o sentido do ônus da sucumbência é justamente o de que se o vencido tivesse respeitado o direito do vencedor ele não teria tido necessidade de ir a Juízo). Mas, mais recentemente, principalmente após a divulgação da tese do advogado Marcos Dessaune, o entendimento vem mudando e se admitindo a indenização pela perda do tempo útil.

2. O que diz tal tese?

RESPOSTA: A tese está exposta no livro “Desvio produtivo do consumidor: o prejuízo do tempo desperdiçado” publicado pela Editora Revista dos Tribunais e nas palavras do autor disponibilizadas em entrevista à Revista Eletrônica Consultor Jurídico, “O desvio produtivo caracteriza-se quando o consumidor, diante de uma situação de mau atendimento, precisa desperdiçar o seu tempo e desviar as suas competências — de uma atividade necessária ou por ele preferida — para tentar resolver um problema criado pelo fornecedor, a um custo de oportunidade indesejado, de natureza irrecuperável”. (http://www.conjur.com.br/2014-mar-26/tempo-gasto-problema-consumo-indenizado-apontam-decisoes).

3. Mas tal dano temporal já não estaria incluso no dano moral?

RESPOSTA: Não. O dano temporal – ao contrário do dano moral que tem uma natureza subjetiva – é objetiva: diz respeito ao tempo, tantas vezes precioso, que muitas vezes faz com o consumidor até mesmo deixe de exercer o seu direito por não ter condições de dele dispor. Dessaune, inclusive, bem diferencia o dano temporal do dano moral e defende que “(…)o tempo pessoal, útil, livre ou produtivo da pessoa-consumidora deveria ter regulamentação jurídica própria, à altura do seu valor, que reputo supremo, que consequentemente o guindasse do atual ostracismo à plena consciência de suas características e importância singulares em nossas breves vidas – assim, acredito, prevenindo-se seu desperdício temerário.” (http://revistavisaojuridica.uol.com.br/advogados-leis-jurisprudencia/71/artigo255346-2.asp

4 . E já há exemplo de aplicação da tese em casos concretos?

RESPOSTA: Sim, e exemplos estão expostos na matéria do Consultor Jurídico acima referida. A repercussão tem sido tão positiva que já se tem conhecimento de cobrança da tese em questão de concurso público. O grande proposito, na minha compreensão, não é gerar indenização, mas gerar a mudança de postura necessária ao efetivo respeito ao tempo do consumidor.