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Defensora Amélia Rocha escreve sobre troca de produto no jornal O Povo

Amélia1. Comprei um produto eletrônico em um sábado. Não pude testar na loja. Em casa, não funcionou. Pelo trabalho, só pude ir novamente a loja no sábado seguinte. Lá me disseram que, como se passaram mais de 3 dias, não teriam qualquer responsabilidade; pois na nota fiscal teria um carimbo que deixaria claro que trocas lá só nos três primeiros dias após a compra. É certo?

RESPOSTA: Não, pois é caso de vício do produto e se deve aplicar os artigos 18 e 26 do Código Brasileiro de Proteção e Defesa do Consumidor – CDC.

2 . E o que dizem tais artigos?

RESPOSTA: Que em casos de vício a responsabilidade é solidária – tanto do fabricante como do comerciante, quem escolhe/indica é o consumidor que terá, em regra, até 90 dias para reclamar.

3. Então a informação do carimbo não é obrigatória, não vincula?

RESPOSTA: Tal carimbo, dentro da interpretação do microssistema consumerista tem valor de cláusula contratual e as cláusulas contratuais não podem contrariar direitos do CDC e devem ser submetidas, como condição de validade e eficácia, aos artigos 46 a 54 do CDC, de modo que a única interpretação juridicamente possível de vinculação da informação contida no carimbo na nota – que, repita-se, tem valor de cláusula contratual – é a de possibilidade de troca involuntária (por simples arrependimento) nos três primeiros dias. Ou seja, de desfazimento do negócio, mesmo que o produto esteja em perfeitas condições de uso (situação que o CDC só prevê no artigo 49 para compras a distância).

4. Isso porque se admitir que a informação do carimbo eximiria a responsabilidade do comerciante pelo vício do produto seria mesmo que negar aplicação aos artigos 18 e 26 do CDC?

RESPOSTA: Exatamente: a cláusula contratual que contrapõe-se aos direitos previstos no CDC é abusiva e, portanto, deverá ser considerada nula de pleno direito, incapaz de produzir efeitos.

5. Então, a loja teria que aceitar a minha reclamação? Não cabe eximir-se pela informação do carimbo?

RESPOSTA: Sim, pois em caso de vício do produto aplica-se os artigos 18 e 26 do CDC. Ou seja, se o produto for essencial, seu conserto diminuir o valor ou for impossível o conserto (art. 18 p. 3o) – sem prejuízo do comerciante acionar regressivamente o fabricante – deverá oportunizar imediatamente ao consumidor escolher entre a troca do produto, o abatimento no preço ou a devolução do dinheiro. Nos demais casos, terá, em regra, até 30 dias para resolver o problema e recuperar a confiança no consumidor. Caso não o faça, o consumidor escolherá uma das alternativas já citadas.

6. Ou seja, a informação do carimbo vale como se fosse um direito de desistência?

RESPOSTA: Sim, pois é uma cláusula contratual e diante da Lei 8078/90 (CDC) essa seria a única interpretação possível.