MP concede semiliberdade a jovem, em regime socioeducativo, para cumprir rotina acadêmica e trabalhar
A defensora pública Luciana Amaral conquistou, após audiência, na última sexta-feira (11), a transferência do primeiro jovem do sistema socioeducativo do Estado do Ceará a ingressar no ensino superior em semiliberdade. O rapaz, de 18 anos, que passou quatro meses cumprindo medida socioeducativa de internação, agora irá cursar Música pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), em Crateús – município localizado a 359,1 km de Fortaleza.
Para a defensora, este feito inédito é uma grande conquista para a Defensoria Pública e exemplo para todos os jovens que buscam se reintegrar à sociedade. Segundo Luciana, apesar do número de reincidências, ainda existem casos de jovens que, dentro dos centros socioeducativos, conseguiram transformações positivas de sua perspectiva sobre o futuro, como aqueles que são alfabetizados ainda enquanto estão inseridos no sistema ou que vão em busca de entrar no mercado de trabalho.
“O caso do jovem é emblemático, pois poderia ter sido mais uma história de um rapaz que possivelmente se revoltaria com o mundo, devido suas condições de vulnerabilidade, mas resolveu acreditar em si mesmo e conseguir vencer pelo estudo, o caminho certo. Essa história, não só renova as forças de quem luta com esse público, como é maior que qualquer conselho ou conversa que poderíamos ter com outros jovens em igual situação. É o exemplo que fortalece nossas falas e torna mais concreto os sonhos dos outros jovens. Traz esperança para todos nós”, destaca.
Transferência
Luciana contou que com toda a formalidade de matrícula do jovem finalizada, ela requereu que a audiência fosse realizada independente de pauta, o que foi aceito pelo juiz. A audiência foi realizada virtualmente e o Ministério Público (MP) e a defesa fizeram os requerimentos oralmente. Logo após, a defensora solicitou a progressão da medida do jovem para a semiliberdade com declínio de competência para a Comarca de Crateús, local mais próximo para que o jovem pudesse estudar. O MP concordou com os pedidos da defensora, que foram deferidos ainda em audiência pelo juiz.
De acordo com a defensora pública, com o feito inédito no Ceará, o jovem tornou-se o primeiro do sistema socioeducativo a passar no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Aprovado em segundo lugar no curso, foi permitido cumprir a medida de maneira mais autônoma. Assim, ele poderá ficar durante a semana dentro do centro socioeducativo, onde é concedido todo o suporte necessário, além do dormitório e das refeições e, aos fins de semana, poderá retornar ao seio familiar. Respondendo em semiliberdade, ele poderá ainda cumprir sua rotina acadêmica e trabalhar.
Semiliberdade
A defensora também explicou que nem sempre os outros jovens passarão pela semiliberdade. “(Alguns) podem sair da internação para a semi; iniciar o cumprimento de medida já pela semi ou sair da internação para a liberação direto. A avaliação é fluida e periódica, para que o jovem tenha restrições em sua vida apenas o tempo necessário. Atualmente, por exemplo, não há nenhuma adolescente cumprindo a semiliberdade no centro feminino, por exemplo. Amanhã já pode haver”, esclarece.
Segundo a defensora pública, a semiliberdade é uma das medidas legais passíveis de ser imposta a jovens infratores. Portanto, é a avaliação do ato infracional em concreto e do comportamento do jovem, bem como reincidência, que sinaliza ao magistrado a melhor medida para a reinserção dentro do caminho social adequado. Assim, ao jovem pode ser imputada medidas cumpridas sem restrição de liberdade, com restrição plena ou restrição limitada, que é o caso da semiliberdade.
Luciana Amaral ainda destacou que, mesmo que nos Centros Socioeducativos haja cada vez mais investimentos em profissionais socioeducadores, de assistência social, enfermagem, psicólogos e vários outros, contudo, ainda há suas deficiências e, para isso, ela destacou que “enquanto defensora, e meus colegas, que também atuam no socioeducativo, estamos lá para pontuar e buscar melhorar. Por isso que o fato de um desses jovens ter conseguido ingressar no ensino superior é tão importante, porque mesmo com as adversidades da vida deles e diante de algumas dificuldades do sistema socioeducativo, ele conseguiu mostrar que é possível.”
Trajetória
Com cerca de 12 de anos de carreira, Luciana Maria Oliveira do Amaral é formada em Direito pela Universidade de Fortaleza (Unifor) com especialização em Direito Público e Direito Processual Penal. A defensora diz que sua trajetória na Defensoria Pública sempre foi sustentada por muitas adversidades. Desde questões estruturais e quantitativas de colegas de carreira, até volume de trabalho e desafios inerentes ao próprio cargo.
Luciana Amaral já atuou em comarcas do interior do Estado, “onde a necessidade é enorme e a defensoria ainda busca meios para a efetivação plena de nosso atendimento”. Além disso, exerceu seu ofício em varas do júri, Núcleo de Atendimento da Defensoria Pública da Infância e Juventude (NADJI), Núcleo de Saúde (NUDESA) e no Núcleo de Atendimento da Petição Inicial (NAPI), até chegar ao Núcleo de Atendimento aos Jovens e Adolescentes em Conflito com a Lei (Nuaja).
“Em todos esses cargos os desafios sempre foram enfrentados com coragem e seriedade. Tanto que, apesar das dificuldades, sempre conseguimos alcançar nossas metas, estando sempre em um processo de consecução de outras”, pontuou.