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Direito ao esquecimento

Ana Cristina Barreto3Ana Cristina Teixeira Barreto*

A tecnologia trouxe avanços significativos para a sociedade, especialmente no tocante à área da comunicação, permitindo a difusão exponencial pela internet de informações e dados, por ser um meio inovador e repleto de possibilidades de expressão.

O Estado brasileiro assumiu o compromisso constitucional com a liberdade de expressão, permitindo a uma sociedade multicultural como a nossa expressar-se livremente, afastando o signo do medo. Por outro lado, estabeleceu limitações que visam à proteção da personalidade e da dignidade humana, vedando a discriminação, a invasão da privacidade, da intimidade, da honra e a incitação ao ódio e à violência.

Se, de um lado, há o reconhecimento ao direito da livre manifestação do pensamento e do conhecimento público de dados e informações, de outra banda, há de se observar o Direito Fundamental à dignidade humana na divulgação dessas informações.

Dentre os direitos fundamentais da pessoa humana, como proteção da personalidade, em face da ampla divulgação de informações, está o direito ao esquecimento que protege a privacidade e imagem do indivíduo contra a eternização de informações negativas a seu respeito de atos cometidos no passado. Isso porque essas informações não devem ser eternizadas como se fosse uma pena perpétua.

O Direito ao esquecimento foi, inicialmente, reconhecido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, com o caso de Gonzalez, em que fora divulgado nas redes sociais, o fato de ter sido devedor da seguridade social. Passada mais de uma década do ocorrido, continuava constando essas informações na internet.

O Tribunal de Justiça da União Europeia decidiu que as empresas deveriam adotar medidas necessárias para retirar informações de pessoas comuns, por entender que não há interesse social na sua divulgação. Em sentido contrário, se as informações constantes das redes sociais referir-se à pessoas públicas e de notoriedade social, o entendimento ainda predominante é de que persiste o interesse público nessas informações.

No Brasil, o direito ao esquecimento foi reconhecido recentemente pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. As decisões marcaram a primeira vez que uma corte superior discutiu o tema no Brasil. Nos dois casos apreciados pelo STJ, um referia-se a Chacina da Candelária, no Rio de Janeiro e o outro, a um caso de estupro e assassinato ocorrido em 1958, em que os familiares da vítima sentiram a necessidade de excluir das redes sociais informações sobre o caso ocorrido, há mais de uma década, informações essas que entendeu o STJ não ser de interesse público.

Segundo o relator dos processos no STJ, Ministro Luís Felipe Salomão, o interesse público no fato delituoso não se perpetua no tempo e tende a sucumbir diante da consumação da resposta penal aplicada, seja com a extinção da pena ou com a absolvição.

O fato é que a eternização de informações é uma superexposição desnecessária que ofende a dignidade humana e o direito de personalidade. Não há sentido em reavivar e eternizar informações de atos cometidos por pessoas no passado, se, como decidiu o STJ, o próprio ilícito já foi sepultado e, estabilizado no tempo.

*Defensora Pública