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Padre Valdir, da Pastoral Carcerária: “Sociedade Civil precisa se mobilizar para o fortalecimento da Defensoria Pública no Brasil”

A Defensoria Pública foi criada no Brasil com a promulgação da Constituição Federal de 1988, prevista no artigo 134. De modo simples, é o órgão público que tem por objetivo garantir a todas as pessoas o acesso à justiça, o atendimento jurídico especializado, em especial para pessoas carentes.

Em muitos estados brasileiros, a Defensoria Pública ainda não existe efetivamente. O atendimento à população é feito por meio de convênios, em geral com a OAB ou outras instituições, em que advogados credenciados realizam o trabalho de defensores públicos. Este sistema de convênios traz alguns inconvenientes, como a dificuldade de controle na qualidade do atendimento ou ainda da quantidade de pessoas atendidas. A atuação da Defensoria Pública está dividida em núcleos especializados: Cidadania e Direitos Humanos, Infância e Juventude, Habitação e Urbanismo, Situação Carcerária, Combate a Discriminação, Racismo e Preconceito, Proteção e Defesa dos Direitos da Mulher e Direitos do Idoso.

Em outubro de 2010 o Presidente Lula sancionou a Lei Orgânica da Defensoria Pública para padronizar o trabalho do defensor público no país e ampliar suas funções, reforçando a criação da Defensoria nos estados de Goiás, Santa Catarina e Paraná. A Lei ainda define que a Defensoria Pública deve atuar dentro dos presídios, sendo assegurado o espaço e as condições adequadas para o atendimento ao preso, que mesmo privado de liberdade, tem direito ao acesso à justiça.

Pe. Valdir João Silveira, Coordenador Nacional da PCr fala sobre a Defensoria Pública e suas funções. Confira:

1. Qual a importância da Defensoria Pública para a população carcerária?

A restrição da liberdade acaba por tolher também a possibilidade da pessoa presa de acessar por si mesmo as informações de seu processo. Como a retomada da liberdade dependerá, via de regra, de decisões judiciais, a principal ânsia da população carcerária é por saber sobre a situação processual, quando terá benefícios, quando extingue a sua pena, etc. A presença da Defensoria Pública no Sistema Carcerário não apenas agilizaria a consecução de benefícios pela pessoas presas, como também aliviaria sensivelmente a enorme carência de informações que atinge a população carcerária.

Além disso, com uma Defensoria atuante no sistema carcerário, muitos dos problemas que, apesar de graves, não chegam ao conhecimento dos principais atores do sistema penal seriam detectados e combatidos. De modo que graves violações de direitos que costumeiramente ocorrem sob as sombras dos muros penitenciários tenderiam a se reduzir e até se extinguir com uma Defensoria Pública estruturada, presente e atuante nos cárceres.

2. Na sua opnião, por que em alguns estados como Paraná ainda não existe Defensoria Pública?

A Constituição Federal estabelece que o Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito.

Contudo, a consolidação de uma democracia parte não apenas da alternância dos mandatários dos Poderes Executivo e Legislativo, mas também com políticas públicas que viabilizem o acesso ao Poder Judiciário.

Dito de outro modo, pode-se falar em efetiva democracia quando as portas dos Tribunais do País estão abertas não só àqueles que podem contratar os préstimos de um advogado, mas principalmente quando há mecanismos que permitem que a população carente, que os grupos vulneráveis, que as pessoas desafortunadas possam “bater” às portas dos Tribunais.

Preocupada com uma política pública de democratização do Poder Judiciário, a Constituição Federal atribuiu ao Estado a obrigatoriedade de prestar assistência jurídica pública, por intermédio da Defensoria Pública.

Quer dizer, portanto, que a Constituição atual, além de elencar a assistência jurídica pública como direito fundamental, atribuiu tal mister ao Estado que deve estar voltado para uma política social de acesso a direitos.

No Estado do Paraná, passados mais de 20 anos da Constituição, não se colocou a Defensoria Pública como prioridade, pois, até os dias de hoje, ainda não se cumpriu o mandamento constitucional, o que vem a prejudicar, segundo dados do Ministério da Justiça, mais de 7.000.000 de paranaenses que não têm voz e são potenciais assistidos da Defensoria Pública.

No Governo Requião, a questão da Defensoria Pública do Estado praticamente não avançou, sendo que um dos últimos atos de governo do então Governador, hoje Senador da República, foi fazer convênio com a Ordem dos Advogados do Brasil para repasse de dinheiro público, sem fazer qualquer alusão à criação da Defensoria Pública.

Tempestivamente, as Associações Nacionais de Defensores Públicos Federais e Estaduais, ANADEF e ANADEP, Pastoral Carcerária Nacional denunciaram a omissão. Concomitante, o novo Governador, Orlando Pessuti, sensibilizado com a situação, iniciou as tratativas pela implantação da Defensoria Pública, estando à frente deste processo o então Secretário, Prof. Nildo Lubke.

O projeto de Lei foi encaminhado pelo Governador Pessuti à Assembléia Legislativa, em menos de 4 meses de gestão. O Deputado Tadeu Veneri, relator do projeto na Assembléia, teve papel fundamental para conseguir a aprovação em primeiro turno.
Todavia, o novo Governador eleito, Beto Richa, ao invés de estabelecer a implantação da Defensoria Pública como prioridade e permitir a votação em segundo turno, simplesmente se omitiu e, por meio de lideranças de governo, não avaliza a votação do projeto enviado pelo seu antecessor, em segundo turno. Em síntese, o novo Governo expos a idéia de que a cidadania e que os direitos da população carente podem esperar, por meras questões políticas.

Quem sofre com tal omissão, de forma clara, é a população carente e os grupos vulneráveis , o que deflui uma mensagem muito nítida: Defensoria Pública não é prioridade no Estado do Paraná, por parte do novo Governador.

Deflui, desse raciocínio, a seguinte conclusão: a população paranaense não conta com uma Defensoria Pública do Estado por mera falta de vontade política dos agentes governamentais que, de forma provinciana, insistem em impedir a efetiva proteção dos direitos humanos dos grupos vulneráveis, a ponto de inibir que a Justiça esteja ao alcance de todos.

3. Por que em alguns estados a Defensoria Pública é inadequada, falha ou insuficiente?

A Defensoria Pública é órgão relativamente novo. Foi criada por obra do Constituinte de 88, ao passo que as demais instituições, como as Procuradorias, o Judiciário e o Ministério Público, já há muito existiam. No entanto, há outro fator que parece ter sido preponderante no processo de constituição das Defensorias estaduais: a mobilização social. Naqueles estados em que houve maior mobilização da sociedade civil organizada, o processo de criação da Defensoria Pública avançou. Obviamente, conta, e muito, o perfil do Governo estadual, vez que a criação da Defensoria depende da iniciativa do Executivo. Assim, Governos mais sensíveis às causas sociais e humanitárias tendem a ser mais ativos na criação e estruturação da Defensoria em seus estados.

Marlise da Silveira Costa e Adriana Bernardes/ AlterComunicare – Ass. de Comunicação/PCrN

 

Fonte: Pastoral Carcerária