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Tico da Maraponga: processo sobre a imprescritibilidade de ações indenizatórias de crimes de tortura policial tem participação de Defensoras Públicas associadas da ADPEC

Francisco Ricardo Costa de Sousa, conhecido como “Tico”, era um pedreiro que foi abordado por policiais do programa Ronda do Quarteirão em Fortaleza, Ceará, no dia 13 de fevereiro de 2014, e encontrado morto no mesmo dia. Ele estava a caminho da casa da mãe quando foi visto pela última vez.

Os relatos indicam que Tico foi espancado, torturado e colocado em uma viatura policial. Mais tarde, ele deu entrada já sem vida no hospital Frotinha da Parangaba. Até hoje a justiça ainda não foi feita e a irmã da vítima, Antônia Costa de Sousa, iniciou uma busca incessante por justiça, acreditando que os policiais envolvidos na abordagem foram os responsáveis pela morte de Tico. Três militares foram investigados, mas acabaram absolvidos em um julgamento em 2016. Antônia e a família não aceitaram a decisão e recorreram da sentença, porém o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em junho de 2023, em decisão do ministro Sebastião Reis Júnior, negou o recurso, mantendo a absolvição dos policiais.

Os familiares de Tico procuraram o Rede Acolhe da Defensoria Pública a fim de ingressar com ação de reparação por danos morais, sendo ajuizada em maio de 2024. No entanto, em primeira instância, o juízo entendeu que o prazo prescricional de cinco anos, aplicável a esse tipo de ação, já havia sido ultrapassado, levando à extinção do processo com resolução do mérito.

A Defensoria Pública recorreu dessa sentença argumentando que, de acordo com o Estatuto de Roma, crime de tortura é imprescritível, e ainda, subsidiariamente, que o Código Civil prevê que o prazo quinquenal somente se inicia com o trânsito em julgado da ação penal, ocorrido em 2 de agosto de 2022.

Após votação na última segunda-feira (09), os Desembargadores membros da 1ª Câmara de Direito Público do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE), acordaram, por unanimidade, em conhecer da Apelação para dar-lhe provimento, pelos exatos termos expendidos pela Relatora Desa. Lisete de Sousa Gadelha, que acatou as teses levantadas pela Defensoria.

A defensora pública e ex-presidenta da Associação das Defensoras e dos Defensores Públicos do Estado do Ceará (ADPEC), Andréa Coelho, que participou da sustentação oral, comenta: “Esse julgamento do TJCE é um importante precedente para garantir a justiça social e a dignidade humana no nosso estado. O crime de tortura, como estabelece o Estatuto de Roma não prescreve, assegurando que os responsáveis por essa grave violação aos direitos humanos não escapem da responsabilidade, independentemente do tempo transcorrido.”

“Esse julgamento vai transcender a esfera desse caso específico. A gente vê que com esse trabalho temos essa mudança de paradigma, estamos diante de um precedente que pode ser utilizado em outros casos que envolvem tortura e violência policial. Não só as vítimas, mas os familiares dessas vítimas podem acionar a justiça por meio da Defensoria Pública e ter o seu direito reconhecido e fazer valer a sua dignidade. Precisamos reconhecer que esse valor é irrenunciável e imprescritível”, comenta a Defensora Pública Gina Kerly, também participante da sustentação oral do referido recurso.