Com a palavra o Defensor

Dra. Mariana Lobo

mariana_loboJá nos primeiros 15 dias de sua atuação na Defensoria Pública, a Defensora Mariana Lobo se mostrou apaixonada pela carreira, por “poder lutar para a concretização de direitos que para os assistidos significava verdadeira transformação de suas vidas e exercício da cidadania”. Passados 12 anos, ela hoje é titular do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC). Ali, amplia ainda mais o contato e diálogo da Instituição com os movimentos sociais e comunidades. Esta tem sido uma marca de sua atuação por onde passa. “Realização é poder trabalhar diariamente com garantia de direitos, inclusão social e efetivação da cidadania com implementação da democracia e justiça social”, afirma. Confira a entrevista:

 

Adpec – Há quanto tempo a senhora atua na Defensoria Pública?

Mariana Lobo – Entrei na Defensoria Pública em maio de 2003. Na época, não tínhamos quase nenhuma estrutura de trabalho e lutávamos pelo reconhecimento junto à sociedade, buscando espaço como Instituição indispensável ao funcionamento do sistema de justiça.

Lembro que com 15 dias de atuação na Defensoria pensei: não quero mais sair daqui! É muito gratificante e apaixonante poder ver na prática os frutos de minha ação, como poder lutar para a concretização de direitos que para os assistidos significava verdadeira transformação de suas vidas e exercício da cidadania.

Atuei, inicialmente, no Juizado Cível e Criminal localizado no Vicente Pinzon. Lá estabeleci um canal de interlocução com as comunidades e os líderes comunitários. A partir de então, ampliei o atendimento e transformei minha sala em local totalmente aberto ao público para acolhimento de todas as demandas, trabalhando também com soluções extrajudiciais de conflitos. As demandas que não eram da competência do Juizado, eu fazia e já levava tudo pronto à sede da Defensoria para dar entrada. Tudo com o foco de estabelecer uma relação de confiança com a comunidade, buscando dar minha contribuição no fortalecimento da Defensoria Pública.

Atuei na Adpec e na Anadep, como diretora, presidenta e vice-presidenta. Percebo que estas participações me trouxeram experiência e amadurecimento institucionais. Muitas foram as lutas e batalhas em que dei minha contribuição para melhorar a Defensoria Pública, como várias foram as conquistas, inclusive em alterações legislativas no plano nacional e estadual.

Trabalhar com garantia de direitos, inclusão social e efetivação de cidadania, implementando a democracia, faz com que cada Defensor Público seja essencial agente de transformação social. Nesse sentido, e valorizando este entendimento, pautei minha trajetória na Defensoria Pública e na Associação de modo que pude estar ao lado de valorosos colegas, no plano nacional e estadual, nas conquistas Institucionais, lutando sempre por uma Defensoria mais forte, reconhecida e valorizada.

Adpec – Como é o seu dia a dia de trabalho no Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas?

Mariana Lobo – No Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas, desempenho minhas funções visando a construção de um diálogo promissor com a sociedade civil, buscando a interlocução com todos os segmentos sociais, órgãos e esferas de poder, observando que muitas das demandas têm melhor, mais eficiente e eficaz solução no âmbito administrativo, sem a necessidade de ajuizamento de ações, tal como decorreu no caso do passe livre intermunicipal da pessoa com deficiência em que já há posicionamento dos Tribunais Superiores sobre o assunto e faltava a efetivação. O diálogo tem funcionado bem, sendo uma forma de solução extrajudicial, e que tenho percebido bastante resultados positivos. Nos demais casos, são ajuizadas as demandas, mas tem como se resolver muitas das questões, de forma rápida e satisfatória, sem a necessidade de judicialização, com articulação e diálogo político e social prévios.

Percebemos e trabalhamos também com a possibilidade de construção de políticas públicas e sociais voltadas à inclusão social das pessoas em situação de vulnerabilidade e no sentido, inclusive, de evitar ofensa aos direitos humanos.

No NDHAC, as demandas são tratadas em âmbito coletivo e individual, com conflito instalado ou de forma preventiva, sempre com uma visão voltada para o que é melhor ao assistido e mais rápido solucionará cada caso, realizando o atendimento diário, participando de várias reuniões, analisando as estratégias e agindo junto com a população para entender todas as peculiaridades da demanda e tomar providências rápidas e efetivas, dando nossa contribuição para a democratização do sistema de justiça.

Adpec – Quais as principais demandas do público-alvo?

Temos uma forte atuação com a população em situação de rua, traçando as demandas estratégicas para esse público alvo, podendo assim atuar na afirmação e garantia de direitos. Também estamos desenvolvendo várias ações voltadas ao público LGBT, tanto atendendo individualmente como analisando demandas em conjunto com as entidades representativas. O estabelecimento de um fluxo para acompanhamento de casos de violências policiais. As necessidades das pessoas com deficiência. Outra demanda é a questão do passe livre intermunicipal, dentre outras tantas.

Há também uma parceria com o Núcleo de Moradia de modo a que possamos nos ajudar, no sentido de cada vez mais prestar um melhor serviço, com qualidade, ao público alvo tão necessitado da efetivação real e eficaz de direitos humanos.

Cada atendimento gera vários desdobramentos, articulações, visitas, encaminhamentos, reuniões e a necessidade de um fluxo de monitoramento das medidas adotadas e evolução das demandas sempre em contato e diálogo com os movimentos sociais e comunidades.

Adpec – Qual o papel do Defensor Público dentro do atual sistema de Justiça?

Mariana Lobo – O Defensor Público é essencial para a democratização do sistema de justiça e equilíbrio da balança social, na medida em que garante o acesso à justiça de forma ampla, com inclusão social, garantia e reconhecimento de direitos e efetivação da cidadania. Em todo o mundo e mormente em um país com grandes desigualdades econômicas e sociais, como o nosso, o fortalecimento da Defensoria Pública é necessário à própria manutenção da democracia, uma vez que o Defensor Público dá vez e voz às pessoas em situação de vulnerabilidade, e garante o acesso à justiça (que não quer dizer somente acesso ao judiciário) de maneira ampla, integral e gratuita, contribuindo para a formação de uma sociedade livre, justa e solidária.

Adpec – Como a sua experiência como titular da Secretaria da Justiça do Estado tem ajudado na atuação defensorial?

Mariana Lobo – Acredito que a compreensão da realidade de fluxo administrativo, ampliação dos mecanismos de solução de conflitos, diálogos Institucionais, articulação política e social, conhecimento de processos e técnicas de efetivação da cidadania, aprendizado em políticas públicas entre outros fatores me auxiliam hoje nas atividades que desempenho no Núcleo de Diretos Humanos. A compreensão e a construção de pontes são essenciais para solução efetiva, eficiente e eficaz de nossas demandas. Outro fator importante é saber e conhecer a estrutura de vários órgãos, bem como seus gestores, além de formar uma visão sistêmica da realidade e dos mecanismos de modo a acessar canais e desenhar fluxos que possam ajudar nossos assistidos na garantia de seus direitos, acesso à justiça e efetivação da cidadania com qualidade e rapidez. Assim, procuro aproveitar ao máximo a experiência adquirida no melhor desenvolvimento de minhas funções defensoriais para somar o conhecimento adquirido na qualidade do meu trabalho na Instituição que tanto amo e escolhi para toda uma vida, e onde quero estar ao lado de meus valorosos colegas ajudando na construção de uma Defensoria cada vez mais forte, reconhecida e valorizada.

Adpec – Quais os maiores desafios na carreira de Defensor Público, sobretudo no seu núcleo de atuação?

Mariana Lobo – Os maiores desafios são o tratamento igualitário entre as carreiras do sistema de justiça, a necessidade de um real conhecimento do trabalho do Defensor Público, ínfima quantidade de Defensores Públicos, estrutura de trabalho, bem como o respeito a todas as garantias e prerrogativas do Defensor Público.

No Núcleo de Direitos Humanos, há carência de recursos humanos, equipe técnica e estrutura para melhor desempenho das atividades.

De grande necessidade é a valorização da carreira e conquista de todos os meios materiais e financeiros para a consecução dos pleitos defensoriais, de modo a ter reconhecimento, respeito e todas as condições necessárias para fortalecer a Defensoria Pública mantendo acesa a chama da justiça para grande parte da população cearense (mais de 80% da população é público alvo da DP).

Muitas vezes, precisamos ser dois em um para conseguir dar conta de todas as demandas e atender a todos os desafios, mesmo sem estrutura de trabalho e equipe de apoio adequadas para o bem desempenhar das funções junto às pessoas em situação de vulnerabilidade e à sociedade civil.

Adpec – E as maiores conquistas/realizações para a senhora?

Mariana Lobo – As maiores conquistas são a satisfação das pessoas atendidas e o fato de ter tido a oportunidade de fazer parte e, ao longo da minha história na Defensoria Pública, ter podido dar minha contribuição nos grandes avanços estaduais e nacionais, inclusive legislativos, da Instituição. Realização é poder trabalhar diariamente com garantia de direitos, inclusão social e efetivação da cidadania com implementação da democracia e justiça social.