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Defensora Amélia Rocha escreve sobre “Pessoa jurídica, consumidor e STJ” no O Povo

Amélia1. A relação de consumo – e em consequência o contrato de consumo – só pode ter por consumidores as pessoas físicas?

RESPOSTA: Não. O CDC – Código de Defesa do Consumidor é expresso ao dizer que as pessoas jurídicas também podem ser consumidoras.

2. Mas na prática é bem difícil saber quando a pessoa jurídica é ou não é consumidora, já que para ser consumidor é preciso ser destinatário final do produto ou serviço e a pessoa jurídica o acaba utilizando, de forma direta ou indireta, nos seus negócios. Como identificar a diferença?

RESPOSTA: De fato, é preciso analisar o caso concreto, mediante algumas premissas. E para melhor explicar, valer-me-ei de decisões do Superior Tribunal de Justiça – STJ, o Tribunal da Cidadania, que tem a missão constitucional de uniformizar a interpretação de leis infraconstitucionais, tal qual o CDC.

Assim é que o STJ já decidiu que “(…)Se a pessoa jurídica não ostenta a condição de consumidora final nem se apresenta em situação de vulnerabilidade, não incidem as regras do Direito do Consumidor (…)” (AgRg no AREsp 133253 / SP, julgado em 02/10/2014) e que “(…)2. O só fato de um dos polos contratuais ser ocupado por instituição financeira não é o bastante para a caracterização de uma relação consumerista, haja vista as diversas situações reiteradamente apontadas pela jurisprudência que não se ajustam às normas do CDC, sobretudo quando na outra ponta se encontra uma pessoa jurídica empresária, como no caso em apreço.” (AgRg no AREsp 543639 / SP, julgado em 02/10/2014). Ou seja, para que a pessoa jurídica seja consumidora é preciso que adquira ou utilize produtos e serviços “(…) em benefício próprio; isto é, para satisfação de suas necessidades pessoais, sem ter o interesse de repassá-los a terceiros, nem empregá-los na geração de outros bens ou serviços. Desse modo, não sendo a empresa destinatária final dos bens adquiridos ou serviços prestados, não está caracterizada a relação de consumo (…)” (AgRg no REsp 916.939/MG citado no AgRg no REsp 1331112 / SP, 21/08/2014).

3. Por favor, traga-me outros exemplos do STJ nesta matéria.

Vamos a alguns exemplos. O STJ já decidiu em (a) caso de compra de aeronave por empresa administradora de imóveis pela aplicação do CDC, entendendo que se trata de “(…) Produto adquirido para atender a uma necessidade própria da pessoa jurídica, não se incorporando ao serviço prestado aos clientes. (…)” (AgRg no REsp 1321083 / PR, 09/09/2014); (b) que quando a pessoa jurídica “(…) firma contrato de seguro visando a proteção de seu próprio patrimônio é considerada destinatária final dos serviços securitários, incidindo, assim, em seu favor, as normas do Código de Defesa do Consumidor.” (REsp 1473828 / RJ, 27/10/2015); (c) mas que “(…) Se o transportador contrata seguro visando à proteção da carga pertencente a terceiro, em regra, não pode ser considerado consumidor, uma vez que utiliza os serviços securitários como instrumento dentro do processo de prestação de serviços e com a finalidade lucrativa.” (REsp 1176019 / RS, 20/10/2015); (d) e decidiu também que “(…) 1. Não são aplicáveis as disposições da legislação consumerista aos financiamentos bancários para incremento da atividade negocial, haja vista não se tratar de relação de consumo nem se vislumbrar na pessoa da empresa tomadora do empréstimo a figura do consumidor final prevista no art. 2º do Código de Defesa do Consumidor. (…)” (AgRg no REsp 1033736/SP, julgado em 20/05/2014).